O ENEM é a principal porta de entrada para o Ensino Superior no Brasil, visto que suas notas podem ser usadas no SISU (Sistema de Seleção Unificada), no PROUNI (Programa Universidade para Todos), em 29 instituições portuguesas, incluindo universidades, institutos politécnicos e escolas superiores, e em outras universidades de países, como Estados Unidos e Canadá.
Em 2023, foram 4.018.414 inscritos e 2.734.100 de estudantes fizeram a prova, o que significa uma participação de 68%. Entre os inscritos, 1.181.081 (65,9%) são da rede pública brasileira, mas 837.622 (70,9%) participaram do Exame. Destes, 46,7% são concluintes do Ensino Médio. Segundo o próprio Ministério da Educação, em análise divulgada em suas redes sociais, ainda com dados da edição anterior do SISU, mais de 1 milhão de jovens que fizeram o ENEM 2023 teriam a possibilidade de ingressar em mais de 840 cursos disponíveis no SISU 2024, e cerca de 60% poderiam utilizar a nota no PROUNI.
Em coletiva oficial, já disponível na plataforma youtube, o MEC divulgou todas as informações sobre o Exame, inclusive, as médias das notas das áreas do conhecimento e, entre estas, as da Redação: nota mínima: 40 pontos; nota máxima 1000; média nacional: 641,6, um pouco acima da média de 2022. A nota da redação tem peso importante na pontuação final e é usada como critério de desempate em diversos programas de acesso de universidades, não por acaso, é considerada decisiva no contexto Enem. Em 2023, somente 60 estudantes conquistaram nota máxima na redação, 4 estudantes da rede pública e 25 da região Nordeste. Na edição anterior, foram apenas 18 notas máximas. Em 2022, 38,1% dos estudantes que concluíram o ensino médio fizeram o exame. Em 2023, esse percentual subiu para 46,7%, mas ainda é baixo e preocupante.
Em todo esse universo estudantil, complexo e, por muitos, incompreendido, números não faltam. Diante deles, é fácil compreender a grandeza do Exame Nacional do Ensino Médio, daí porque a necessidade de se saber mais sobre ele e de compreender melhor que esses números precisam mudar. Por isso, para além deles, é preciso interpretar seu contexto e, nesse sentido, o que eles podem representar.
No Brasil, ainda existe uma evasão escolar considerável, principalmente, quando se trata de Ensino Médio. Muito embora sejam os alunos da rede pública a maioria que compõe este e todos os níveis de ensino, mesmo depois das cotas, já prorrogadas por dez anos, pelo atual Governo, e de alguns investimentos no setor de ensino público, como ampliação de vagas, no cabo da jornada, os melhores desempenhos em exames vestibulares não são de alunos de escolas públicas. A maioria destas, inegavelmente, ainda está longe de instruir bem seus estudantes, para que enfrentem o ENEM, de igual modo preparados, assim como estudantes do setor privado.
Muitos daqueles, infelizmente, nem se prestam ao ENEM, porque não podem se dedicar aos estudos, antes, precisam abandonar a escola para ingressar precocemente no mercado de trabalho, caso contrário, seu núcleo familiar vivenciará mais dificuldades financeiras. O descrédito na Universidade e em tudo que a formação em nível superior pode proporcionar ocorre porque a formação intelectual, muito embora mais segura, consistente e frutífera, demora quatro, cinco, às vezes, dez anos, para dar o resultado e grande parte dos jovens brasileiros compõe uma esfera social de emergências cotidianas, que lhes afastam da perspectiva de uma formação densa intelectualmente falando.
Segundo a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação, em reportagem no primeiro semestre de 2023, “em outubro de 2022, os 32 Tribunais de Contas da União se uniram para visitar e avaliar a infraestrutura das escolas no país e identificaram que 57% das salas de aula são inadequadas. Os números são assustadores: 31% das escolas visitadas não tinham coleta de esgoto, 8% não possuíam coleta de lixo e 82,38% das cozinhas não possuíam alvará da Vigilância Sanitária para funcionamento (...) A fiscalização encontrou também 63% das escolas sem bibliotecas, mesmo índice entre as que não possuem sala de leitura.
O percentual de unidades que não possuem laboratório ou sala de informática é ainda maior, 88%.” Estes também são números preocupantes e somente ratificam a complexidade de um sistema de ensino cujo esforço não tem suprido algumas das necessidades mínimas dos alunos, o que, em parte, justifica a evasão, o ineficaz desempenho estudantil e outros graves e históricos desafios da educação brasileira, que, se não reparados, resultarão em contínuos desempenhos fracos na escola, no Enem e, pior que tudo, na vida de jovens brasileiros.
Escola tem de ser lugar de esperança, não de frustrações e desenganos. No entanto, há mais de duas décadas, o Enem, que nasceu para aferir a situação do Ensino Médio do país, evidencia mazelas de nossas escolas, e nada, nada de resolutivo tem sido feito para que essa conjuntura seja significativamente modificada.
O ano letivo 2024 está à porta; o ENEM 2023 ainda rende. Vão começar as maratonas no SISU, no PROUNI, etc, etc. As tensões estão longe do fim. Mas, o pior de tudo isso é que muitos jovens ficarão à espera de vagas que não existem e com as sequelas irreparáveis da ausência de uma formação que o Estado lhes negou, porque são oriundos de uma escola que não educa, mas que forma, ainda que basicamente, para a mão de obra de subemprego, e, por isso, são incapazes de protagonismos com relevância social. A conta disso, sem dúvida, a sociedade já conhece. Lamentável!
Klítia Cimene – professora de Língua Portuguesa na Rede Pública da Paraíba